Perguntas e respostas sobre o Black Bloc
O que é um Black Bloc?
É um coletivo formado por indivíduos e grupos de afinidade anarquistas, que se unem para uma ação. A substância do Black Bloc muda de ação para ação, mas os objetivos principais como mostrar solidariedade frente à violência do Estado policial e dirigir uma crítica do ponto de vista anarquista, continuam os mesmos.
O Black Bloc é uma organização?
Algumas pessoas têm a falsa impressão de que podem entrar na “Organização Black Bloc”. Não existe uma organização fixa do Black Bloc entre os protestos. Existe o movimento anarquista que sempre esteve lá (há mais ou menos um século). Você pode encarar o Black Bloc como um coletivo temporário de anarquistas, que fazem parte de um todo numa passeata ou num protesto.
Por que um Black Bloc?
Existem vários motivos para justificar porque alguns anarquistas formam um Black Bloc nos protestos. Essas razões incluem:
- Solidariedade - um número massivo de anarquistas providenciam cobertura contra a repressão policial e demonstram os princípios da solidariedade da classe trabalhadora;
- Visibilidade - o Black Bloc como a parada gay;
- Idéias - um forma de apresentar o ponto de vista anarquista ao protesto;
- Ajuda mútua e livre associação - mostra o exemplo de como grupos de afinidade podem formar um grupo maior e articular os objetivos em comum;
- Autonomia - um método para impulsionar o movimento além do mero reformismo e dos apelos ao Estado para remediar a injustiça.
Onde surgiu a idéia do Black Bloc?
Black Blocs na América do Norte surgiram na época da guerra do golfo(1991). Foram inspirados pelo movimento autonomista alemão da década de 80. Esse movimento era conhecido pelas batalhas urbanas travadas com a polícia, mas também por mostrar uma alternativa radical aos outros movimentos de protesto.
Quantos são os exemplos de Black Bloc anteriores na América do Norte?
O Black Bloc não foi inventado em Seattle. Numerosos Black Blocs aconteceram na década de 90. Um dos maiores foi o do ano passado, no Millions For Mumia, o qual tinha entre 1500 e 2000 manifestantes. Esse foi um bom exemplo de um Black Bloc não-violento, o qual tinha como objetivo demonstrar a sua solidariedade com Mumia Abu-Jamal e, lembrar a “esquerda” do movimento, que nós existimos (de fato, vários artigos pós-M4M da imprensa esquerdista ignoraram completamente a presença anarquista do Millions For Mumia).
Uma breve lista de notáveis Black Blocs:
- 1992- Washington D.C., Black Bloc no protesto anti-guerra do golfo. Janelas do Banco Mundial destruídas.
- 1992- San Francisco, Black Bloc protesta contra os 500 anos de exploração e genocídio promovidos pelo primeiro mundo.
- 1999- Philadelphia, 24 de abril, 1500-2000 anarquistas marcham no Black Bloc durante o Millions For Mumia.
- 1999- Seattle, 30 de novembro, Black Bloc se engendra na destruição do distrito financeiro central.
- 2000- 16 e 17 de abril, o Bloco Revolucionário Anti-Capitalista (RACB) participa dos protestos anti-FMI/BM, em Washington D.C. Entre 700 e 1000 anarquistas participaram no A16.
- 2000- Primeiro de maio, Black Blocs em Nova York, Chicago e Portland.
Todos os Black Blocs destróem a propriedade?
Depende. O Black Bloc de Seattle, que marchou no dia 30 de novembro, nos protestos anti-OMC, foi o mesmo que colocou os Black blocs nos radares nacionais e internacionais. Eles se engendraram em uma variedade de atividades, inclusive destruição de propriedade. Isso não foi um vandalismo adolescente sem sentido – foi feito por razões políticas. Aliás, os membros do Black Bloc N30 não vinham todos de Eugene, Oregon.
Por que os membros do Black Bloc usam máscaras?
No ano passado, houve uns poucos e ingênuos pedidos liberais para que os anarquistas tirassem as suas máscaras. Aliás, existem muitos anarquistas do Black Bloc que nem sequer usam máscaras durante os bloqueios e ações. Esses são, por assim dizer, os camaradas “aparecidos”. Anarquistas usam máscaras por muitas razões. A principal é o reconhecimento feito posteriormente pela polícia (que filma os ativistas e cria uma ficha para cada um deles). A polícia faz isso mesmo quando existem leis proibindo (vide red squads). Máscaras promovem anonimato e identidade comum. E também protege aqueles que querem se engendrar em atos ilegais e escapar, para depois lutar em outros dias.
Quantos anarquistas participaram da “Batalha de Seattle”?
Se você lê a maioria dos artigos da mídia convencional, você será levado a acreditar que havia 50 anarquistas em Seattle, que vieram só para quebrar janelas. De fato, as estimativas dos conservadores mostram 4000 anarquistas participantes das atividades. O número verdadeiro é difícil de ser determinado, uma vez que não foi feito um levantamento da quantidade de participantes. Você simplesmente não pode contar qualquer camarada vestido de preto como sendo um anarquista. A maioria deles vinham da costa oeste dos EUA, mas também da América do Norte inteira. Uns poucos vieram do Reino Unido.
Em que tipo de atividades eles estavam envolvidos?
Sim, anarquistas estavam envolvidos na destruição de propriedade, mas essa era só uma pequena fração do envolvimento anarquista nas atividades do N30. O engraçado é que, os mesmos anarquistas que foram repreendidos pela Esquerda por quebrarem janelas, estavam entre as milhares de pessoas que, de uma forma não-violenta, bloquearam a conferência da OMC. Isso fica evidente nos vídeos que mostram o Black Bloc ajudando a bloquear o acesso ao hotel.
A mídia corporativa sempre tem mostrado uma péssima cobertura do trabalho duro, no qual os ativistas se engendram. Eles se concentram em mostrar o espetacular, mas não podem dar a conhecer todo o processo preparatório, etc. Os anarquistas estavam engajados nas atividades dos “bastidores” e do trabalho pesado. As atividades dos milhares d anarquistas envolvidos na organização do N30 fizeram disso tudo um grande sucesso.
Os anarquistas estavam envolvidos nas seguintes atividades:
Mídia e comunicações: Anarquistas em Seattle armaram uma “hotline”, meses antes do evento. Outros anarquistas estavam envolvidos com o Centro de Mídia Independente e houve dúzias deles que agiram como jornalistas amadores. O CMI tem suas origens no Countermedia, o qual era uma organização mediática anarquista que foi projetada para a Convenção Democrata de 1996, em Chicago. Muitos outros filmaram as manifestações de Seattle e conseguiram realizar um curto filme com as imagens das 24 horas de ações no N30.
Anarquistas construíram sites antes do N30 e da semana anti-OMC...esses sites ajudaram as pessoas a se prepararem para as ações, a se comunicar e a se auto-educar. Vários sites conseguiram uma cobertura contínua das ações e arquivaram a cobertura da mídia convencional também. Alguns anarquistas escreveram colunas para os jornáis, especialmente Geov Parrish, que cobriu o N30 para o Seattle Weekly e Eat The State.
Treinamento e planejamento das ações: Anarquistas ajudaram no treinamento não-violento e aprenderam com ele também. Um dos coordenadores principais da não-violência era o DAN (Direct Action Network), o qual conta com o apoio anarquista.
Cultural: Isso ficou mais evidente nos marionetes que estavam presentes na semana anti-OMC, em Seattle. Alguns deles foram feitos pela Art and Revolution Convergence, um grupo da Bay Area. Muitos camaradas também viram a maravilhosa bandinha anarquista.
Ação direta: Os exemplos mais óbvios foram os prédios ocupados durante a semana em Seattle. Um desses squats aparece na rede americana TV News. A mídia chefona de seattle também deu grande cobertura dos squats e falou sobre os conflitos causados pela ação direta.
Marcha dos trabalhadores: Anarquistas participaram na marcha, especialmente o contingente IWW (Industrial Workers of the World). A IWW ajudou a desviar alguns corre-corres dos centros comerciais para as ruas ocupadas, onde eles ajudaram a fechar a área ao redor do centro de convenções.
Corpo médico e legal: Isso inclui tratamento dos feridos nos eventos e suporte legal para os presos durante as ações.
Ocupação do centro: Muitos anarquistas ajudaram a impedir o encontro da OMC. Eles ajudaram a bloquear hotéis (onde se encontravam os dirigentes), ruas e cruzamentos. Muitos sofreram os efeitos dos gases e outros foram algemados enquanto bloqueavam as ruas. Mais anarquistas estavam envolvidos nos bloqueios do que na destruição de propriedade, um ponto importante que a mídia convencional e a esquerda “esquecem” de mencionar.
Destruição de propriedade: Sem necessidade de mais comentários aqui...
N30 no mundo: Houve dúzias de eventos no mundo inteiro, dos quais a maioria foi organizado por anarquistas.
Táticas e estratégias:
Black Blocs são conhecidos pelo uso de táticas e estratégias que não são conhecidas pelos ativistas tradicionais. Algumas dessas táticas são antagônicas. Outras são ilegais. Mas, foram eficientes nos protestos. Dada a ruptura, promovida pela polícia do Estado, no ativismo tradicional, mais manifestantes deveriam considerar estas táticas como meios para a sua própria proteção e segurança. Elas variam de Black Bloc para Black Bloc. Algumas mais comuns são Libertação e Corrente de Força. Libertação acontece quando quando o Bloco liberta pessoas que não querem ser presas. Isto normalmente funciona se você supera os policiais em número. Também pode funcionar porque os policiais ficam chocados em ver manifestantes tentando soltar e libertar alguém. A corrente de força ajuda o Bloco a manter coesão, e dificulta a tentativa de dispersar os manifestantes. É como uma formação policial, só que mais fluida e orgânica.
Libertação:
O ativismo tradicional que envolve desobediência civil tem desenvolvido uma rotina altamente coreografada quando se trata de ser preso pela polícia. Depois, nós vemos exemplos de como a desobediência civil tem se tornado OBEDIÊNCIA civil, na qual os ativistas negociam com a polícia ou mesmo perguntam como ser preso. Sem necessidade de mencionar aqui, nem todo mundo numa manifestação quer ser preso. Dada a propensão da polícia para prender manifestantes por razões arbitrárias- por marchar na rua sem permissão, usar máscaras- uma técnica é necessária para manter os ativistas fora da cadeia. Libertar um manifestante é bem simples: quando um ativista é preso, o Bloco de anarquistas age para livrar aquela pessoa dos policiais. Ás vezes, uma briga é necessária para libertar o ativista, mas se vocês têm o elemento surpresa, podem, normalmente, ser bem-sucedidos porque os policias ficam chocados ao ver que os manifestantes não estão jogando o jogo pelas regras (negociando a sua própria prisão). Libertação funciona em duas situações:
- quando existem poucos policiais e muitos ativistas envolvidos ou;
- quando o Bloco supera a polícia em número numa proporção mínima de 3:1 ou mais.
Um ponto importante a ser ressaltado: libertar um preso é um atividade ilegal. Não seja preso tentando libertar alguém ou você vai Ter que enfrentar sérias acusações. É importante pesar os benefícios de libertar a pessoa (isso é difícil de ser feito no calor do momento). Obviamente, libertar uma pessoa é mais importante se essa pessoa fez algo que a levará a acusações hediondas.
Corrente de força:
Durante as manifestações, os membros do Black bloc cruzam os braços. Essa ação promove a coesão e a solidariedade nos bloqueios e dificulta as táticas dispersivas aplicadas pela polícia.
Máscaras:
Usar máscaras é uma tática tão eficiente que cada vez mais e mais, os departamentos policias estão implementando leis anti-máscaras. A prática do uso das máscaras é controversa dentro dos círculos ativistas. Alguns ativistas criticam o uso de máscaras pois isso contradiz a imagem do ativismo de ser sempre “aberto” e acessível, em outras palavras, “não temos nada a esconder”. Existem várias razões para explicar o uso de máscaras durante uma ação:
- para a proteção contra a investigação ilegal da polícia;
- para promover anonimato entre o grupo, que protege contra o surgimento e ascenção de um líder “carismático”;
- servir como camuflagem para os ativistas engajados em atividades ilegais durante as ações e;
- promover solidariedade dentro do Bloco.